Marta Watanabe
Uma alteração que passou despercebida na primeira leitura da MP que regulou a lei contábil - a MP 449, de 12 de dezembro - deve atingir em cheio os exportadores. Até dezembro de 2008, as empresas abatiam os créditos do Programa de Integração Social (PIS), da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) com o valor devido mensalmente de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Um dos artigos da MP, porém, impede essa compensação a partir de janeiro de 2009. O problema é que, no caso dos exportadores, se os créditos não puderem ser compensados com IR e CSLL, na prática não poderão mais ser compensados com os demais tributos federais. Isso porque os exportadores têm, por conta da imunidade tributária das exportações, débitos de PIS, Cofins e IPI muito baixos.
Pela nova norma, os débitos de PIS/Cofins e IPI só poderão ser compensados com o IR e com a CSLL no momento do ajuste de quem paga o lucro real por estimativa. Ou seja, os créditos de PIS e Cofins gerados durante todo o ano de 2009 só poderão ser compensados em março de 2010.
Para a Receita Federal, a medida será interessante, diz José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Sem a compensação durante todo o ano, explica, a Receita terá em 2009 uma arrecadação que só entraria em 2010. Ou seja, com o artifício, o órgão terá arrecadação adicional contabilizada como receita de 2009. Procurada, a Receita não se manifestou.
Para os exportadores, diz Castro, isso traz um problema de fluxo de caixa durante todo o ano exatamente num momento em que falta crédito no mercado. Sem a compensação, a empresa terá de tirar do caixa recursos para pagar o IR e a CSLL no decorrer do ano. Segundo a AEB, isso ocorrerá com quem tem mais de 30% do faturamento com exportações, porque a empresa não conseguirá absorver todo o crédito de PIS e Cofins. A nova restrição tributária vale para as empresas que recolhem IR pelo regime do lucro real por estimativa. De acordo com a associação, o problema atingirá entre 20% e 30% das mil empresas responsáveis por 90% das exportações em valor e prejudica principalmente quem fabrica produtos manufaturados.
Apesar do impacto financeiro sobre o capital de giro dos exportadores, a restrição é considerada de difícil questionamento judicial, explica Pedro Miguel Ferreira Custódio, do Souza, Schneider e Pugliese Advogados. Para muitas empresas, diz ele, a falta de compensação durante o ano tornará inviável a compensação somente no ajuste em 2010. "A compensação só será possível se a empresa tiver uma diferença de IR e CSLL a recolher. Se ela já tiver recolhido o valor exato ou tiver direito a ressarcimento, ela não conseguirá fazer a compensação, o que gerará novos créditos de IPI, Cofins e PIS."
"A compensação permite monetizar os créditos. Trata-se de uma medida pró-crise, na contramão do que deve ser feito na situação atual", diz Roberto Giannetti da Fonseca, diretor de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Segundo ele, a entidade já está procurando parlamentares para propor a retirada do dispositivo da MP 449 e até mesmo o veto da Presidência da República, caso o texto sobre o assunto seja mantido no Congresso.
A Fiesp não tem cálculos do volume de créditos que passaria a ser acumulado no decorrer do ano, mas se trata de um impacto "relevante", principalmente para alguns setores, como o automobilístico, siderúrgico e de carnes industrializadas, por exemplo.
Mesmo com a possibilidade de compensar o PIS/Cofins e IPI com o IR e a CSLL mensalmente, empresas de alguns setores já acumulam créditos tributários. A JBS, do ramo frigorífico, informa em seu último balanço um acúmulo de R$ 155 milhões em créditos de PIS/Cofins e IPI.
Para Paulo Vaz, do Levy & Salomão, um setor que pode sofrer grande impacto com a nova medida é o de informática, que tem créditos altos de PIS/Cofins na importação das mercadorias. "Como esses equipamentos contam com tributação reduzida na venda, não há grande volume de débitos do próprio PIS/Cofins para compensação." O tributarista Heleno Torres acredita que as empresas devem reavaliar a sistemática pela qual pagam IR hoje e verificar se, com a nova regra, ainda vale a pena optar durante 2009 pelo regime de apuração por estimativa.